terça-feira, 3 de novembro de 2009

a tia...


morava ali na vila medeiros, na subidinha que ia para a igreja nossa senhora do loreto (sempre achei esse nome estranho). chamava-se rua neneca. do número, não me lembro.

portão de ripas de madeira, que era fechado com uma espécie de argola, que encaixava-se na primeira ripa e num pedaço de cano fixado no muro baixo.
no pequeno quintal, havia de ambos os lados, plantas e flores diversas. para alcançar a entrada da casa, era necessário descer os três ou quatro degraus do lado de dentro do portão.

havia na minúscula varanda um vaso de uma folhagem qualquer. bem em frente, havia uma porta que dava para a sala, onde havia uma poltrona, uma cadeira e uma mesinha enfeitada com uma toalhinha de crochê, sobre ela, uma bíblia. ainda na parede da sala, havia um quadro com uma foto da tia e daquele que tinha sido seu marido.

à esquerda, uma porta que dava na cozinha. e nesta, uma outra que dava para o único quarto. não me lembro de detalhes do quarto, porém, lembro-me de uma colcha de retalhos sobre a cama.

logo à entrada da cozinha de chão vermelhão, havia, em frente, uma pia, coisa rara naquele tempo. nela ficava a moringa de água fresca, sempre sobre um prato e uma canequinha de alumínio cor de groselha ao lado.
era na pia também que ficava o suporte do coador de café, que era feito de flanela.
mais à direita o fogãozinho jacaré, esmaltado com pintinhas brancas.

encostado à parede do fundo um “guarda-comida”.

ao lado direito da porta, uma mesa com uma gaveta, onde eram guardados os talheres.

o forro da casa toda era verde.

era nesse lugar que a tia ovídia morava com seu filho, anorfo.

eu adorava ir na casa dela. porém, nunca ia sozinha, pois, por ser ainda muito pequena, minha mãe não permitia. mandava sempre os meus irmãos me levarem. algumas vezes, eu dormia lá. tinha um cheirinho gostoso e ela, apesar da idade, estava sempre disposta a fazer alguma coisa para nos agradar.

lembro-me das balas “mole”, que ela preparava com tanto carinho. botava um pouco de água na panela, açúcar e ficava esperando apurar. depois pegava uma bacia com água fria, jogava uma colherada dessa calda e estava pronta a bala mole. que delícia era aquilo!

o macarrão que ela preparava também era imbatível.

era muito engraçado, quando o cachorro corria atrás do próprio rabo, vê-la dando bronca:
- capucho, te deu sapituca?!

e ríamos sem parar...

mas de tudo, o que eu mais gostava, era que ela, de tão bondosa, andava pelas ruas de olho no chão e, se encontrasse um botão, ela o pegava p mim. botão mesmo, desses de roupa. eu os colecionava. e tinha alguns lindos.

quase que todas as vezes em que eu ia na sua casa, via a mesma cena: ela secando as mãos no avental e botando a mão no bolso para tirar um botão e me dar.
eu ficava imensamente feliz.

ontem, olhando fotos antigas, eu a vi... e essa visão me encheu de saudades.
era a irmã mais velha de meu pai, que, se fosse vivo, teria completado 100 anos no último dia 24.

2 comentários:

Quasímodo disse...

Reminiscências...

Como é bom tê-las. Mas como às vezes doem.

Belíssimo relato.

Beijos.

Lu disse...

Ai que dilícia de causo!
Adoro seus causos,e sempre vou repetir isso. ( hahahhaha)

Aká as balas mole, eram chamadas de puxa-puxa.


Beeeeeeijos!